sábado, 29 de dezembro de 2012

[A Revolta Selvagem] Prólogo

Boa noite galera!

Eu hoje tive uma ótima ideia que acredito ter potencial para um pequeno livro. Não sei se vou ter tempo, empenho e estímulo para fazê-lo, então não posso garantir. Se for o caso, é bem possível que esta "proposta" de Prólogo seja editada para melhor introduzir a história. De todo modo, compartilho com vocês o que escrevi até então em uma viagem de carro.

Espero que gostem. E isto também é um até 2013. Feliz Ano Novo a todos!!


A Revolta Selvagem


Prólogo


A velha rainha tinha duas filhas gêmeas. Clea e Juliet eram ainda moças quando um embate entre Rilop, o selvagem febril, e Servus, o príncipe e futuro Rei, levou embora o jovem sucessor. Não havia provas, mas Juliet passou semanas chorando e jurando de pés juntos que Rilop usou uma pequena lanceta envenenada pelas costas do príncipe em uma das pausas cordiais da luta. Eu juro, dizia ela entre lagrimas, na pausa o infeliz espetou a lanceta dentro da maçã e a ofereceu todo amigável! Servus nem percebeu o que havia engolido, mas era claro para todo o castelo que de parte em parte do combate o príncipe ficava mais lento e vulnerável. Sua técnica, que superava a do selvagem, não o salvou quando um movimento muito mais lento abriu sua guarda. Rilop não desperdiçou, e a cabeça de Servus rolou pelo chão de mármore, um brinde rubro sendo servido em pleno ar para a família real. Os selvagens capturados foram libertados e se uniram a Rilop, que prometeu nunca mais se aproximar do Castelo Aigamar.
Dali em diante, Clea e Juliet passaram a ser educadas severa e regularmente para assumirem o papel de rainhas quando preciso, sucedendo a mãe. A rainha tinha este importante papel há décadas e o povo dizia que ela viveria para sempre, mas rainha Milena fora muito clara: a dor pela perda de Servus era grande e inesperada, mas as regras deviam ser seguidas. O trono de Aigamar precisava ter sempre um sucessor em treinamento. Aigamar tinha o importante papel de legislar sobre todas as terras da Sombra. Se caísse, a luz dominaria estes terrenos, o equilíbrio necessário seria desestabilizado e todo o planeta de Vendit colapsaria sobre si mesmo, potencialmente levando para o mesmo fim todo o sistema solar de Teuma.
Frente a isto, Aigamar tinha os melhores guerreiros de Vendit, assim como os melhores magos de sombra. O papel dos guerreiros era meramente garantir a ordem e paz entre as colônias das sombras. Já os magos eram os responsáveis pela grande tarefa. No complexo ciclo de estudos na Casa Sombria, os magos formados aprendiam as artes contra a luz. Pode parecer estranho, mas eles eram tão bons quanto se pode ser. Lutar contra a luz não os tornava maus: estes apenas faziam o que era necessário. De seus postos nas fronteiras da luz e protegidos pelo arco de Aigamar, um enorme monumento que os fincava naquela realidade e ao mesmo tempo dava energia para os feitiços, os magos se revezavam para manter a luz distante.
Clea e Juliet conheciam bem essa realidade, pois a estudavam todos os dias. O treino já durava mais de dez anos, e ambas tinham plenas condições de governar. Clea era mais rígida e determinada. Já Juliet era um tanto contida, tímida e um pouco peluda, mas tinha algo que faltava à irmã: a capacidade de analisar todos os lados de uma situação, fosse de pobres ou ricos, magos ou prisioneiros, e dar um veredicto que fosse justo, não apenas apropriado. Nem sempre as leis de Aigamar apoiavam isso, mas Juliet era assim.
Não achavam que precisariam se preocupar nunca com quem iria ocupar o cargo de rainha, a mãe tinha fôlego para governar por mais 50 anos sem qualquer duvida. Até que numa manhã, uma das criadas soltou um grito que pôde ser ouvido em todo o castelo. Clea sempre acordava cedo para praticar arremesso de facas com a mão esquerda enquanto escrevia poemas com a direita, tudo ao som de música clássica e por vezes celta. O grito também trouxe Juliet dos estábulos, o arreio do cavalo seguro na mão com tanta força que os nós dos dedos estavam brancos.
- O que aconteceu, Pleuna?! - perguntou aflita.
- A... o.... Oh meu Deus, estamos perdidos... - foi tudo o que a mulher disse antes de sair correndo aos soluços. As gêmeas, que chegaram na porta do grande quarto real ao mesmo tempo, se entreolharam. A diferença entre as duas era enorme, embora em aparência fossem muito semelhantes. Clea tinha uma expressão mais decidida e Juliet mais calculista e bondosa, mas ambas possuíam os mesmos olhos azuis astutos e o cabelo loiro escuro, grandes franjas caindo sobre o olho esquerdo. Elas respiraram fundo e entraram juntas, de mãos dadas.
Nada parecia errado. A rainha estava sentada em sua poltrona predileta, de frente para a enorme janela circular que dominava o quarto. Ela estava de costas para a porta e parecia estar muito confortável. As irmãs, confiantes, chegaram perto. Quem sabe a criada gritou por ter ouvido uma grosseria. Milena nunca era grosseira com quem quer que fosse, porém detestava ser interrompida quando estava perdida em pensamentos diante de sua janela e sentada em sua poltrona. De repente uma conjuntura de fatores tinha provocado aquilo, apenas uma situação desagradável. Mas nada era tão simples...
- Clea... Ali na janela..!! - disse em um arquejo de desespero Juliet.
Clea se aproximou e observou o que a irmã apontava. Logo percebeu que havia um buraco irregular no vidro. Em seguida olhou para a mãe... e ficou branca.
A rainha Milena estava com uma expressão tranqüila e calma. Os olhos estavam sem nem mesmo piscar. Uma lágrima escorria por seu olho esquerdo, mas da cor vermelha. Ela vinha de um ferimento fatal na testa dela, do qual uma enorme mancha preta já havia se formado. O típico veneno...
- Lorde nos salve... Irmã, estudamos isso todos os dias! - disse Juliet.
Clea estava sem palavras, mas olhou firme para a irmã em pânico.
- Sim. O selvagem febril quebrou sua promessa. Ele voltou para destruir o que restou da família real.

A rainha estava morta. O momento das gêmeas havia chegado. E junto com ele, o destino de Aigamar, das terras sombrias, do equilíbrio entre luz e sombras, do planeta Vendit e talvez de todo o sistema de Teuma. A Revolta Selvagem estava começando.

terça-feira, 18 de dezembro de 2012

[Yacamim Livro 1] Capítulos 18 e 19

Aí seguem mais dois capítulos e o primeiro insight sobre os vilões...


CAPÍTULO 18
Vic estava sobre pedras íngremes em uma colina sombria. Tudo em volta era breu, exceto o caminho no qual se encontrava, que ia sempre subindo. O percurso era iluminado por um fundo cor de fogo em brasa, o que dava vida apenas às silhuetas das cordilheiras rochosas e dava ao local uma aparência de uma fornalha gigante.
Sabia que precisava seguir, pé ante pé, rumo a fortaleza no topo. Era enorme, deviam caber uns mil Maracanãs ali dentro. Ele seguiu sua escalada heróica, temendo tropeçar a cada nova investida, caindo no infinito que o cercava de ambos os lados. Pequenas pedras se soltavam cada vez que seu pé dava impulso para levar o corpo à frente, o impacto delas rolando pela encosta gelava o estômago do garoto. A fortaleza ia se aproximando lentamente, e com ela a iluminação da trilha e a confiança aumentavam.
Depois do que pareceu uma eternidade, o portão estava ali, diante dele. Ofegando terrivelmente, ele apoiou as mãos nos joelhos para se recuperar. Sentia o peito subir e descer veloz ante o grande
esforço. Gotas de suor escorriam de seu rosto. Todo o esforço, no entanto, fora válido. Lá estava ele. Bastava entrar...
Ele esticou os dedos, agarrando uma das barras do portão com força. Chegou a sentir o contato gelado do ferro com a pele por um momento, e então tudo se tornou escuridão.
O ritmado e agradável som das ondas do mar batendo na areia. Vic estava de olhos fechados, deitado confortavelmente, provavelmente em uma espriguiçadeira , muito próximo à água. Abriu os olhos lentamente. Acertou a superfície na qual estava esticado, seu jeans e blusa branca esquentando ao sol. No entanto, estava distante do quebrar das ondas, até mesmo longe da areia. Encontrava-se na varanda de uma casa de praia... a mesma que visitou em sonho, dias atrás.
Não se assustou, embora o coração batesse mais rápido. Sentou-se devagar, e lá estava Apoena diante dele. Talvez ela estivesse ali desde o princípio, ou talvez houvesse se materializado naquele momento. Pouco importava. Vic estava tremendamente feliz por estar ali, pois estava desesperadamente precisando da ajuda dos Supremos.
Olá, Yacamim. Bem-vindo novamente.
Apoena saudou ele em reverência. Ela sorriu em resposta.
Não é preciso palavras. Hoje gostaria de me comunicar com você por intermédio da energia.
Tome isto como uma aula. Daqui em diante, este tipo de contato será fundamental, pois pode ser feito de maneira rápida, enquanto está consciente e em ação. Considere como um auxílio direto e imediato, do qual você muito necessitará.
Com isto, ela se calou. Fez o gesto da Hélio-Hidra e abriu as mãos, repousando as palmas para cima nas pernas cruzadas. Vic a imitou, e tão logo o fez, sentiu Yacamim preenchendo cada parcela de seu ser. Mais do que isto, não era como ser um passageiro em uma viagem emocionante, ele era parte daquilo. Via e sentia o que Yacamim vivenciava. A união das duas personalidades estava começando.
Foi como abrir um canal de diálogo, começar uma conversa. Mas não qualquer conversa, era uma experiência única e extremamente prazeirosa. Tudo era escuro e silencioso, nada se fazia sentir além de uma energia poderosa e fluida que vinha na direção dele, como se estivesse parado diante de uma onda quebrando. Porém, não houve dor ou impacto, e Vic não foi carregado pelo mar. A energia veio e circulou o corpo do rapaz, passando informações com uma plenitude de sentidos que palavras jamais fariam. Ele viu relances da fortaleza, de galpões, de mata e água corrente. Viu seis homens e uma mulher o parados diante dele, em formação triangular com a mulher no centro. Sentiu o aroma de terra molhada, de nascente, de pólvora. De sangue. Ouviu risadas e gritos, trechos partidos de conversas e ameaças. Tudo isso enquanto sua pele reagia em sincronia aos estímulos, os pêlos se arrepiando, os músculos enrijecendo e relaxando como antes e depois de uma batalha.
Logo após, tão rápido quanto vieram, os estímulos se foram. Mas Yacamim não os deixou partir sem dar em troca. Mandou grandes doses de energia na direção da corrente: fé, compreensão, alegria, agradecimento. Aromas de flores, da mata, do sol quente. Sons de animais, do farfalhar das folhas ao vento, pios de coruja e cantos de cigarras. Imagens de estrelas, muitas estrelas. O nascer e o pôr do sol, o bater do mar contra rochedos. E uma gratidão avassaladora, de espantar por seu tamanho e força.
A corrente continuou viva, pois os três outros Supremos Terrenos abriram seus canais e vieram à Yacamim. Talvez a gratidão manifestada tenha batido à porta deles, desejosa por entrar. Toda a troca já travada então circulou por eles, e cada um adicionava sua visão e sentimento ao conjunto. Como uma enorme cadeia positiva de amor, coragem, fé, receptividade, alegria e gratidão, os cinco ali unidos pareciam pulsar em união. Enquanto a cadeia girava entre eles, cada vez maior e mais bela, uma luz alva e brilhante ia ganhando força, brilhando cada vez mais. A escuridão no entorno foi se afastando, dominada pela maravilhosa claridade. A cadeia de sentimentos girava tão rápido agora que não mais agregava novas informações. Pelo contrário, parecia agora que todos eram uma unidade só, que por sua vez abastecia a crescente luz que agora ia dominando as sombras por completo. A velocidade ia aumentando cada vez mais, até que as sensações não eram mais separadas umas das outras. Havia uma só, que resumia todas as outras. Por fim, o ciclo era tamanho que a luz se abasteceu completamente. Houve uma explosão de claridade, e tudo se tornou branco como neve.
Pios. Pios de pássaros. Vic abriu os olhos. Estava dentro de seu saco de dormir, assim como Amanda e Clara. O sol começava a bater na lona. Espiou o relógio de Clara, que repousava ao lado da mochila: 7:30. Lentamente, para não acordar as duas, saiu de seu casulo noturno, abriu o zíper da barraca e partiu para a claridade lá fora.
Era uma bela mata, com árvores altas e frondosas a perder de vista. Embora a beleza fosse o suficiente para perder o rumo e admirar solenemente por vários minutos, Vic não tinha olhos para a natureza local. Sentou ao lado da barraca e fechou os olhos, relembrando os maravilhosos senti- mentos que vivenciara em sonho. Tão logo o fez, os sentiu pulsarem dentro de si. A deliciosa sensa- ção o pegou de surpresa, e ele caiu deitado de costas na grama. O coração batendo rápido, respirou e inspirou alongadamente, e tornou a "tocar" aquelas agradáveis sensações. Novamente elas vibra- ram em resposta. Imediatamente percebeu que não eram meras emoções que respondiam, eram os próprios Supremos. Fascinado, tornou a entrar em conversação, aprendendo e dividindo experiênci- as, novamente contando com a presença de Yacamim naquela abençoada floresta.
Algum tempo depois, as moças saíram da barraca. A súbita presença delas fez com que ele saísse de seu estado de concentração e, com isso, rompesse a comunicação. Não se importou. Não fazia idéia de quanto tempo estava ali, mas havia depreendido o suficiente por agora. Tinha certeza de que estas conversas com os Supremos faziam parte de seu treinamento, e agora entendia a busca interna que precisava fazer para encontrar a si mesmo e consequentemente, se tornar de fato Yacamim.
Bom dia, moças. Acordei cedo e não quis acordá-las. Tive um sonho...
Vic colocou as duas à par do que vivenciou em sonho e tentou traduzir o melhor possível a experiência sensorial que teve com os Supremos, tanto dormindo quanto acordado, logo em seguida. Clara fez uma expressão enigmática, que podia indicar que não havia entendido ou acreditado em uma palavra sequer, ou que estava refletindo intensamente sobre aquilo que ouvia. Por sua vez, Amanda estava fascinada, os olhos brilhando intensamente como de costume quando ouvia os relatos relacionados à Yacamim.
Ao terminar, Vic deixou as duas pensarem sobre a novidade e começou a preparar o café-da-manhã. Agora que havia interrompido a conversação com os Supremos, a fome havia aparecido, não só pela primeira vez no dia como avassaladora. Aparentemente, por mais maravilhosa que fosse a experiência, era preciso tomar cuidado, pois grandes doses de energia lhe eram retiradas para poder vivenciar aquele tipo de ligação divina pelo menos por enquanto.
Os três comeram frutas e ovos mexidos. Vic preparou a fogueira enquanto Clara quebrava e mexia os ovos e Amanda cortava as frutas. As duas pareciam ainda surpresas demais para falar, o que não o incomodou. Parecia-lhe ter passado anos falando desde a noite anterior.
Embora tivesse descrito para as duas as sensações de se comunicar com os Supremos por intermédio da energia, o que foi conversado não entrou em questão. Vic começava a arquitetar um plano, com todo o suporte das divindades, mas preferia manter isto em sigilo por enquanto. Adiantar detalhes antes da execução apenas seviria para deixa-las ansiosas desnecessariamente.
Cerca de dez minutos depois, seguiram viagem. Fogueira apagada e coberta com terra, barraca dobrada, os três seguiram trilha rumo à Petrópolis, cada qual com um peso nas costas: Amanda com a sacola de suprimentos, Vic com a barraca e Clara com sua mochila. A caminhada ainda era longa, mas iriam esticar viagem o quanto fosse possível, parando pouco a fim de chegar à cidade imperial antes do anoitecer.

CAPÍTULO 19

O avião chacoalhava intensamente. Certamente era um daqueles transportes antigos, que deveriam estar em um museu ao invés de ainda assolar os céus com suas enormes formas moldadas no horizonte. Uma gigantesca ave metálica como aquela poderia fazer um estrago imenso caindo em uma metrópole como São Paulo. Deus que o livrasse disso. Pelo menos hoje, que esse maldito avião chegasse inteiro a seu destino.
Fazia algum tempo que Vertigo não chamava os seis membros de elite ao serviço. Mas ali estavam eles, atendendo ao chamado novamente. Ganhavam a vida como mercenários durante os tem- pos de ditadura militar. Naquela época, eram sete. Pouco importava o empregador. Quem pagasse mais, teria o prazer de receber os serviços dos Terríveis. Até que Vertigo e a recém formada Compa- nhia enxergou o talento deles. Colocou a equipe de pesquisa para trabalhar, e um ano depois, os chamou para a sede. Um tanto apreensivos, os sete ficaram diante do poderoso chefe para receber, de suas mãos, poderes sobrenaturais, nas palavras dele. A única condição: a única mulher seria se- parada do grupo, trabalharia especialmente para ele. Todos se conheciam desde que se entendiam por gente, quase todo o tempo com armas nas mãos. No fim, o poder pulsante e a imensa possibilidade de serem simplesmente mortos caso resusassem ganhou, e ali os sete passaram a ser seis. Apesar da ruptura, desde aquele dia eram invencíveis em batalha. Nada os fazia sombra. Toda batalha era um espetáculo, com cada um desfilando suas habilidades adquiridas. Porém, era caro mantê-los na luta o tempo todo e, por isso, eram a elite. O topo do exército da Companhia. Só entravam
em ação em pontos-chave. Não estavam reclamando, entraram no avião ávidos por batalhar novamente. Treinos exaustivos e bonecos não se comparavam ao real. E pela animação de Vertigo ao telefone, a coisa era grande. Finalmente o antigo sonho do chefe à vista, e um prêmio polpudo caso cumprissem a meta: matar o herói. 

sábado, 17 de novembro de 2012

[Yacamim Livro 1] Capítulos 16 e 17


Olá, caros! Preparem-se porque aqui os preparativos acabam. Está na hora de começar a ação! o/


CAPÍTULO 16

Mas senhora Silvia, ainda não entendo...
Querida, estamos conversando há quase uma hora, deixe as formalidade de lado. Me chame apenas de Silvia, sim?
Certo, claro...
Amanda e Silvia, a senhora moradora do apartamento, estavam sentadas à mesa da salinha. Clara, totalmente desinteressada do assunto, vendo que ninguém lhe dava um motivo satisfatório para estarem ali ao invés de seguir para enfrentar a Companhia e, principalmente, os Terríveis, desistiu. Estava sentada sob os joelhos em um velho sofá a um canto da sala, digitando distraídamente em um de seus laptops. As mãos dela voavam pelas teclas, mas ela mal parecia prestar atenção, como se estivesse descarregando energia, fazendo uma terapia ao teclar. Já Vic estava encostado na janela, olhando o movimento da rua abaixo deles, refletindo sobre tudo o que havia acontecido até então, e tentando decidir que passo tomar a seguir.
Ah, me desculpe menina, eu ainda não decorei seu nome. Você já me disse, eu sei, mas a idade...
É Amanda, senho... quero dizer, Silvia.
Amanda, sim, sim... é verdade. A senhora tomou o último gole de seu chá. Depois levantou os olhinhos miúdos e admirou a garota-índia. É um nome tão bonito quanto você.
Obrigada respondeu Amanda, levemente constrangida.
Você ainda não entende, não é? Deixe-me explicar. Silvia pousou as mãos no colo e olhou em volta. Era uma senhora simpática, que usava pantufas, saia azul comprida e uma blusa em V sem decote. Os cabelos brancos estavam presos em um coque, e um colar de conchas repousava em seu pescoço. Parecia uma típica senhora, vestida com roupas de senhora, e amistosa como as senhoras costumam ser. Minha diversão, junto com meu marido, era trabalhar na magia e construir níveis cada vez mais avançados dela. Nosso espaço de treino era este apartamento. Com o tempo, ficamos tão bons nisso, que descobrimos ser capazes de afetar todo o prédio. Anos depois, ele, que era mais forte, conseguia interagir comigo, comunicar frases simples ou pequenas ações a quilômetros de distância. Eu e ele treinamos muito e usávamos este apartamento para treinar. Meu marido...

Ih, de novo? Era Clara. Ao ouvir menção pela enésima vez do marido, ela fechara o laptop com força, e agora tinha aquela expressão rabugenta no olhar. Vinha coisa pesada aí. Muito bonita a sua história e tudo, mas você continua girando em círculos aqui.
Como assim? E seu nome é...?
Clara. Eu já lhe disse isso.
Certo, me desculpe. Não precisa se aborrecer.
A senhora ficou levemente chateada, pois fechou a expressão também. Levantou-se da mesa, deixando uma confusa Amanda assistindo à cena, e foi para perto de Vic, talvez sentindo a energia pesar no ambiente próximo à Clara.
Só estou tentando saber começou Clara, sentindo que passou do ponto , há alguns bons minutos, o que diabos estamos fazendo aqui. Por que Vic resolveu que tinha que encontrar a senhora... Como que...
Ei! Era Vic quem falava. Havia se virado de costas para o trânsito lá fora. Encostou-se no vidro e olhou de maneira firme para Clara. Não trate Silvia desta maneira. Ela está apenas lhe dizendo o que você precisa saber. O resto, como os princípios que regem os encantamentos desta casa, precisam ser descobertos por nós, os visitantes. Só assim poderemos permanecer.
Clara olhou para Vic, ainda sem entender. Vic devolveu com confiança o olhar. Amanda continuava confusa, olhando de Clara para Silvia e Vic como se acompanhasse uma partida de tênis. No entanto, Silvia abriu um sorriso enorme, e bateu palmas exaltadas na comemoração.
É isso, isso mesmo! Que bom que você pôde compreender, Yacamim.
Ora, como assim? Exclamou Clara, indignada. Eu passo um tempão gastando a minha saliva com a senhora, e ele entra e a convence em um minuto? Alguém pode me explicar o que...
Eu posso, Clara. Fique calma. Amanda se levantou da mesa e foi se sentar no sofá, ao lado de Clara, que ainda bufava agitada. Como você deve ter visto na fachada, este é o Edifício Tenente Érico. O que você tem caso forme a sigla deste nome?
A sigla...... AAAAAH!!
Clara ficou tão surpresa que escancarou a boca e não conseguiu mais fechar. Olhava de Amanda para Vic, de Vic para Silvia, em profunda surpresa.
Tudo faz sentido agora, não é querida? O supremo terreno conhecido hoje por Eté é meu marido.

***

A senhora quer dizer que ele está vivo? Pode entrar aqui a qualquer momento?
Clara se levantou sobressaltada, teria derrubado o laptop caso Amanda não o agarrasse antes. A garota ruiva percebeu o que quase fez, e agradeceu à amiga com o olhar.
Clara... é Clara, não é? Perguntou de bom humor a senhora. Estou brincando, sei o seu nome. Érico morreu há muitos anos, nos comunicamos em raríssimas ocasiões, infelizmente... mas sei que ele está servindo à Hélio-Hidra da melhor forma, e me orgulho de ser a eterna esposa de um supremo como ele. Mas você precisa se acalmar Silvia olhou para Vic, preocupada. Ela é sempre assim?

Não, não é respondeu Vic. Nem imagino porque ela está tão agitada.
Ah, você não imagina?? Victor, eu tenho a primeira chance em anos de finalmente vingar a morte da minha família, e nós estamos aqui sentados tomando chá! Isso é ridículo!
Ela tinha começado a se acalmar, mas falou isso tudo quase gritando, e muito rápido. Soltou o corpo, afundando no sofá, e cruzou os braços.
Clara, nós...
Tudo bem, Yacamim falou Silvia. Deixe que eu respondo esta.
Ela foi até o sofá e, antes que Amanda pudesse educadamente ceder o lugar, a senhora se sentou
entre as garotas. Em seguida fez um sinal para que Vic se aproximasse. Inesperadamente, tirou de um bolso da saia que havia passado despercebido pelo garoto um charuto. Acendeu. Tinha aroma de baunilha, que logo se espalhou pela sala.
Me desculpem, um velho hábito. Mas é cheiroso, não é? As garotas concordaram. Clara um tanto indiferente e desconfiada, Amanda com um sorriso feliz, como se estivesse em um dia comum conversando com a avó. Vic estava tão surpreso com este súbito hábito da senhora que não respondeu. Eté os chamou aqui para que pudessem descansar para a viagem que farão. Mas, principalmente, chamou para que vocês se protegessem.
Como assim? Perguntou Vic. Tomamos precauções, não estamos sendo seguidos.
Ora, Yacamim, use sua sabedoria... Vertigo esperou muito por este momento para deixar que você escape entre os dedos dele tão facilmente. Vocês estavam sim, sendo seguidos. Neste exato momento, toda a Companhia sabe que vocês estão aqui.
Meu Deus, Vic, nós vamos causar outra explosão... exclamou Amanda, olhando para a expressão dura de Clara, ambas lembrando do apartamento em chamas da hacker e do sacrifício de Dan para que escapassem Vamos correr daqui!
Vic concordou com a cabeça, as meninas estavam se levantando...
Acalmem-se vocês. Vamos, agora mesmo. O tom era enigmático, enfático mas sem ser grosseiro. Eles pararam na mesma posição em que estavam, congelados. Relaxem, pelos céus!
As garotas voltaram a se sentar. Vic voltou para perto do sofá, apenas para contestar.
Silvia, perdemos Dan em situação parecida, precisamos...
Eu sei, Yacamim. Mas não se preocupe. Não ouviu a história que lhe contei sobre o nosso estudo de magia? Como logo o espalhamos para todo o prédio?
A compreensão logo os atingiu.
É claro! Exclamou Clara. Ninguém pode chegar até a gente...
... Porque aqui dentro estamos protegidos pelos encantamentos de Silvia! Completou Vic. ... E pelos meus, é claro afirmou uma voz profunda e masculina.
Todos olharam em volta, até mesmo Silvia se surpreendeu. A voz vinha de Amanda.
Érico! Meu amor, que bom ouvir sua voz!
Eté.

CAPÍTULO 17


Na presença do supremo, Vic pulsava em outro ritmo. Todo o seu corpo reagia à força do Supremo, assim como nos contatos com Apoena e no Jardim dos Manacás. A força divina parecia sempre trazer à tona Vic em sua personalidade plena, no todo de seu potencial, como Yacamim.
Yacamim, como é bom vê-lo à salvo. Você não pode dar à Companhia a vantagem do ataque novamente, não tem energia ainda para atuar na defesa. Por isso os encaminhei pela energia até aqui, onde estarão protegidos.
Clara observava a cena em choque. Toda a cor de sua pele havia ido embora, ela estava branca como cera. Certamente nunca havia presenciado algo como aquilo, e não estava conseguindo absorver. Silvia, encantada por reencontrar o marido, olhava para Amanda com os olhos brilhantes e lacrimosos, mas respeitou o momento com Yacamim e se manteve em silêncio. Como distração, permaneceu olhando e ouvindo Eté, mas apoiou a cabeça de Clara em seu ombro, para confortá-la.
Eté... não podemos ficar aqui. O tempo é curto, podemos perder o rastro.
Não, Yacamim. Você precisa ficar aqui por agora. Saia apenas no cair da noite, é o melhor momento. Darei minha proteção a vocês até que se afastem o suficiente. Não deixem de se disfarçar o melhor que puderem.
Certo. Vic estava com tantos sentimentos confusos, que não conseguia se concentrar inteiramente Eu... eu não sei se estou pronto, se serei capaz...
Yacamim, nós Supremos não temos todas as respostas. Tudo pode dar certo ou errado. Mas não há tempo para a preparação que gostaríamos que você tivesse antes de se confrontar com Vertigo. A invasão platina está muito mais próxima do que pensávamos anteriormente, e a energia tem estado cada vez mais agitada. A escuridão da Companhia tem eclipsado cada dia mais nossa brilhante luz de vida. Não nos resta muito tempo.
Eu sei, mas...
Não irá lhe servir de nada as preocupações sem sentido. Você está tão pronto quanto poderia estar, e um motivo pessoal de amor e perda para lhe mover e dar incentivo.
Sim, Eté disse Yacamim. Você tem toda razão.
Estaremos acompanhando, iremos ajudar quando possível. Agora, descansem. Vocês precisarão partir quando a noite cair...
Para onde vamos, senhor? Perguntou Clara, recuperando a voz.
Ora Clara, tenho certeza de que é exatamente você quem tem a resposta. Oriente-os até o local. Os Supremos estarão com vocês.

***

Era noite. Haviam montado acampamento no fim da serra que ia em direção a Petrópolis. Foram de ônibus até ali, no último horário, usando roupas longas e toucas na cabeça emprestadas por Silvia, encobrindo boa parte dos cabelos dos três, tomando o tempo frio como aliado e dificultando em muito a identificação deles.
Clara estava no meio da barraca, logo abaixo da lamparina, separando cuidadosamente o conteúdo de sua mochila. Aparentemente, ou a garota tinha comportamento oposto quando estava fora de casa, ou a perda do lar fez com que subitamente mudasse seus hábitos. Havia compartimentos internos em cada cantinho da mochila, que se revelou incrivelmente espaçosa aos olhos de Vic e Amanda. Dela surgiram dois laptops, carregadores, cabos diversos, outro rádio modificado, uma bela quantia em dinheiro e muitas, muitas baterias.
Depois de um tempo organizando o material, ela levantou os olhos e viu os dois admirando seu trabalho.
É a minha mochila de emergência. Mantenho-a sempre pronta para imprevistos. Já fiz trabalhos perigosos se sabotagem e invasão para e contra empresas grandes, é sempre bom estar preparada para sair a qualquer momento.
Os dois assentiram. Não tinham nada além da roupa do corpo, parte dela recém-adquirida, e a sacola de Amanda, lotada de suprimentos. Vic se sentia um aspirante a herói com armadura de papelão e arma de plástico. Agora entendia o quanto a Força se desestabilizou pela perda do Banco. Estes pensamentos apenas flutuavam pela mente dele, sem que conseguisse absorver nada daquilo. Dan era o que girava em seu consciente, e cada vez que o amável rosto dele assumia o quadro mental em primeiro plano, uma dor lancinante rasgava o peito dele, acompanhada de uma enorme sensação de impotência. Seu melhor amigo morreu para salva-lo. A Companhia não iria ficar impune.
É melhor irmos deitar informou Clara Precisamos levantar acampamento bem cedo. Quanto estivermos um pouco mais próximos de Petrópolis, volto a captar as comunicações da Companhia.
Por que Petrópolis? perguntou Amanda.
Bom, para triangular a posição da comunicação e poder sintonizar na conversa, horas atrás precisei, além da frequência que Dan me deu, determinar a origem do sinal. E vinha diretamente de lá. Mais precisamente dos arredores da rodoviária.
Amanda assentiu e entrou em seu saco de dormir novo. Vic já estava há tempos no seu, de olhos fechados mas plenamente acordado, travando silenciosas batalhas internas. Clara terminou de organizar seu material, apagou a luz da barraca e se deitou. Tudo o que ouviam agora era o som da mata e de seus insetos, imunes à presença daqueles três em seus domínios. 



quinta-feira, 15 de novembro de 2012

[realidade] Mãe

Bem... prefiro escrever ficção mas de vez em quando é bom falar da realidade. E da vida como ela é. Não quero ser negativista aqui não, acho a vida linda (tenho achado isso cada vez mais nos últimos tempos), cheia de oportunidades, pessoas interessantes, lugares a conhecer, etc etc. Mas a vida começa e termina, e embora a gente saiba que isso vai acontecer a todos, é sempre um momento complicado. Tenho um caso próximo meu então vou falar com todos vocês. Eu sou o cliente no divã e vocês são meus psicólogos, ok?
Bem, acho que só quem já viveu uma situação da perda de um parente próximo sabe como é. Muda muito a sua perspectiva sobre a vida, a noção sobre o tempo que você e os outros têm... a noção de que pode ser de uma hora pra outra. De certa forma, eu aprendi tudo isso quando minha mãe morreu no ano passado, vítima de um acidente de carro. Foi traumático, sofrido e difícil. Ela estava em protocolo de morte cerebral e o processo todo levou praticamente uma semana. Dias e dias de angústia, de visitas ao hospital. Por duas vezes entrei e fiquei ao lado dela, um corpo paralisado e machucado no lugar do que era a minha mãe, maravilhosa, cheia de vida, risonha, engraçada. Pense numa pessoa que não perde uma piada, que tem a melhor risada que alguém pode ter? Alguém que acima de tudo ama você incondicionalmente. E pense em tudo isso apagado de uma hora pra outra.
Nem tudo era flores na minha relação com ela não. Nos últimos anos de vida dela nós nos desentendemos muito. Passavamos vários meses sem nos falar. No último ano e meio de vida ela desenvolveu um transtorno mental e foi dia a dia deixando de ser quem ela era. Em um dia ela era um caco. No outro, era a pessoa mais feliz e eufórica do mundo. Nenhuma das duas era minha mãe, não de verdade. Foi difícil demais acompanhar o processo, e a dor não pára por aí.
Vivenciei de forma distante a luta contra e a favor da vida, enquanto os meses iam passando e ela alternava entre tentativas de suicídio e internações sucessivas. Nem posso imaginar o quão doloroso foi acompanhar isso de perto - para colocar em contexto, ela morava em Brasília, eu no Rio -, mas sei que daqui foi duro, muito duro. Pior ainda porque eu a visitava mais ou menos de três em três meses, e em duas ocasiões quando voltei pro Rio aconteceu uma nova tentativa de suicídio. Isso começou a tirar todo o meu foco da minha vida, eu me sentia deprimido assim que acordava e a sensação me acompanhava ao longo do dia como um convidado indesejado.
Para piorar, a última vez que falei com ela não foi nada feliz. Ela estava no auge dos seus transtornos. Foi por telefone. Eu estava em Brasília, mas na casa dos meus avós maternos - ela na ocasião vivia com um cara em outro apartamento e queria que eu ficasse lá, mas não havia a menor chance de isso acontecer. Era um ambiente impróprio e que não me causava qualquer desejo de permanência. Bem, ela bateu muita boca na ligação, disse que eu estava sendo manipulado por todo mundo. Que todos estavam contra ela, que ela só estava tentando ser feliz. Bem, exigiria uma explicação muito maior para entender porque ninguém apoiava a relação dela, mas basta dizer que o cara era um grosso, que tirou toda a vaidade e liberdade dela, tirou a feminilidade, e por aí vai. Ela virou de uma mulher independente que fazia o que queria, mesmo doente, para um cachorrinho submisso, e ainda mais triste do que antes, embora se recusasse a ver isso. Resolvi eu, espertamente, falar para ela que eu iria passar os dois últimos dias da minha estadia na casa do meu pai. Pronto. Ela ficou revoltadíssima porque pro meu pai eu tinha tempo, para ela não. Fui tentando falar e ela avisando que ia desligar. No terceiro aviso. Ela desligou............. ela desligou para sempre.

Algum tempo depois ela tinha se mudado com o cara para uma cidade no meio do nada. Mas estava infeliz e resolveu bater a poeira, dar uma chance para si mesma. Resolveu voltar para Brasília e para a casa dos meus avós. Entrou no carro com todas as coisas... mas com vários problemas. Tinha tomado remédios pesados - necessários mas que a deixavam sonolenta. Os pneus do carro estavam carecas. Tinha chovido. O carro estava pesado, com muita bagagem. E para completar, ela estava sem cinto. Bom... o carro atravessou a pista depois de rodar e foi pego por um caminhão. O caminhão nada sofreu, por sinal. Já minha mãe... não está mais aqui. E eu prefiro crer que, onde quer que ela esteja, ela está melhor agora. Pelo menos é tudo que eu posso desejar. Mãe, eu não sei onde você está... mas nunca duvide que amo você demais.

terça-feira, 6 de novembro de 2012

[Yacamim Livro 1] Capítulos 14 e 15

Olá pessoal! Mais dois capítulos do livro. Aqui, em uma grande reviravolta, o grupo de Yacamim sofre uma perda inestimável ao mesmo tempo em que ganha novos e incertos apoios... serão confiáveis??


CAPÍTULO 14

A chuva passava em uma cortina densa de água. Pela janela, Vic observava o movimento dos mo- radores, imaginando como seria ter uma vida normal novamente. Tinha certeza de ter assumido um caminho sem volta, e embora não se arrependesse disso, era estranho pensar nas responsabilida- des e esperanças que tantas pessoas que ele desconhecia até então depositavam nele há anos. Seu pai e seu melhor amigo faziam parte desse grupo, e Vic daria cada gota de sangue e suor que tivesse no corpo para fazer jus a todos eles.
O trio desceu do carro correndo da chuva, assim que ele parou nos arredores da Tijuca. Subiram até o oitavo andar de um edifício de aparência antiga e largada. O prédio ficava ligeiramente isolado dos demais daquela região, tendo apenas uma praça à frente, o que aumentava a impressão de abandono.
Bateram à porta do 801. Vic preferiu não fazer perguntas e deixar o inesperado fazer parte de sua rotina, como vinha acontecendo até então. Uma garota apareceu na entrada do apartamento. Era baixa nos seus quinze anos, de cabelos ruivos com mechas coloridas e óculos de aro arredondado. Tinha a pele bastante clara que denunciava meses ou até anos sem bronzeamento. Ligeiramente desajeitada mas com um ar esperto, parecia o tipo de mulher com quem Vic não se meteria. Dan, no entanto, abriu um sorriso ao vê-la, dando um abraço que foi retribuído sem o mesmo entusiasmo pela garota.
Olá, Clara. Desculpe-me por chegar assim, de repente, mas é um caso de vida ou morte. Pode- mos entrar?
Hm... claro.
Com um ar ligeiramente confuso, ela deu um passo para o lado e segurou a porta aberta para que os visitantes entrassem. O apartamento era minúsculo. Provavelmente havia sido um quarto e sala, mas a parede de divisão fora demolida, de modo que havia apenas uma mesa, uma pequena cozi- nha e uma cama em primeiro plano. Não havia luz natural ali, a única fonte de iluminação vinha de uma lâmpada no teto. No lado mais escuro do apartamento, ao lado de uma porta de acesso à va- randa fechada, havia um computador com nada menos do que três monitores acoplados, uma pol- trona de couro gasta, dezenas de cds e dvds espalhados na bancada, fios, ferros de solda, latas de Fanta Uva e restos de biscoitos e salgadinhos.
Desculpem pela bagunça, não costumo receber visitas...
Apesar do comentário, Clara não fez o menor gesto para limpar ou tentar esconder a confusão. Vic gostou disso, ao menos ela não tinha vergonha de mostrar o que era e agir naturalmente, o que era bom sinal. A transparência era uma qualidade que ele prezava bastante. A garota se acomodou em sua poltrona diante das telas, espanando migalhas do encosto de braço antes de levantar o olhar para eles.
Então, Dan, a que devo a visita?
O rapaz olhou para os amigos, pensando como começar.
Estes aqui são companheiros hélio-hidranos, Amanda e Vic. Estamos em uma missão crucial
para a HH, e possivelmente, para toda a América Latina.
A garota olhou impassível para eles. Victor percebeu com certo prazer que era a primeira vez que

alguém a quem era apresentado não corria para ele dando-lhe saudações, cumprimentos e votos de sucesso.
Oh, olá vocês ela acenou com a cabeça para os dois, como se tivesse acabado de perceber a presença deles. Ambos retribuíram o cumprimento Dan, confesso que não estou muito preocupa- da com o destino da América, contanto que eu tenha dinheiro para pagar as contas no fim do mês. Então, se você espera que eu ajude nessa sua causa santa, vai ter que me dizer o que quer e o quanto vou ganhar por isso.
Amanda e Vic não esperavam por essa, e se olharam com os olhos arregalados. Clara continuou calma, como se fizesse aquilo todos os dias. Dan também não se sobressaltou, mas percebeu o es- panto dos amigos e lhes falou em meio-tom, de modo reservado Ela já prestou alguns serviços para o Banco. É uma hacker incrível, capta qualquer transmissão e coloca até satélite em órbita, mas só trabalha com a grana no bolso e não é de meias palavras. Não se preocupem, eu cuido dis- so.
Ele tornou a olhar para a garota sentada ao computador.
O negócio é o seguinte: você deve se lembrar da Companhia. Nossos conflitos com eles estão mais graves do que nunca, e os caras não estão brincando. Atiraram contra o nosso carro e não es- tão medindo forças para nos liquidar. Precisamos saber o que estão tramando. Estive como refém deles e sei que usam essa frequência para se comunicar, provavelmente encriptada. Dan entre- gou a ela um pedaço de papel com alguns números escritos Basta que você acesse essa comuni- cação para que ouçamos a conversa. Vamos lhe pagar bem.
Ele esticou o braço, pegou a sacola no ombro de Amanda, abriu um dos compartimentos e o es- vaziou na mesa do computador de Clara, espalhando notas de cinquenta e cem reais sobre as pi- lhas de mídias usadas.
Dan! Era Amanda que chamava, em meio-tom, mas o rapaz a ignorou. Continuou fitando Clara com o mesmo olhar que a moça dirigiu a ele segundos antes. Pareciam jogadores de poker, olhando um para o outro espera do próximo movimento. Lentamente, a garota pegou o dinheiro, passou os dedos pelas notas e as guardou em um mochila marrom que estava no chão ao lado da poltrona. Fechado.
Ela logo começou a trabalhar. Estalou todos os dedos das mãos, o que arrepiou os pêlos dos bra- ços de Vic, pegou um velho rádio no armário, conectou em uma entrada modificada um cabo USB e plugou no computador. Abriu uma sequência de letras e números em uma língua que Vic desconhe- cia, digitou em velocidade assustadora códigos e termos, senhas e instruções, e ficou calada por alguns minutos.
E então? Dan ousou perguntar, finalmente.
Estou quase lá, relaxe respondeu ela, impaciente.
De fato, chiados vindos do rádio se fizeram ouvir pouco depois. Estações entravam e saiam de

sintonia rapidamente, produzindo uma melodia estranha. Vic temeu que fizessem contato com ali- éns, tamanha a aleatoriedade com que as músicas, notícias e vozes se misturavam e se separavam na velha caixa. Aos poucos, as mudanças foram diminuindo. Fez-se estática por alguns segundos, e então, pouco a pouco, uma comunicação ia entrando em sintonia.
"......fechando o cerco.....
.....tendido, prossiga.
................fechadas, dando a volta...... equipe de cobertura.....

....ok.....façam......cautela a invasão.
.......... senhor."
Todos no apartamento olhavam boquiabertos para o radinho, esperando ouvir mais, captar algo

mais além daquelas palavras. Mas não foi preciso esperar muito. Passos ecoaram por todos os la- dos no entorno da casa. Como uma bigorna congelante, um peso gigantesco caiu no estômago de Vic. Invasão. A Companhia os seguiu. Estavam perdidos.

CAPÍTULO 15

Clara meio gritava, meio balbuciava enquanto girava em círculos, o que fazia com que suas frases parecessem a transmissão que ouviram no rádio.
Os trouxe até aqui........ cilada....... na minha porta..... absurdo....
Dan passou a mão pelos cabelos, segurou a garota em desespero pelos ombros e olhou calma- mente para ela com seus olhos muito verdes.
Clara, preciso que vocês os tire daqui, tudo bem? Vic precisa ser protegido, ainda é cedo demais para um confronto. Vou ganhar tempo ficando aqui, mas vocês precisam ir agora mesmo.
Todos encararam o rapaz. Até Clara perdeu a fala, olhando séria para ele.
Dan, você não pode fazer isso! tentou Amanda, mal atraindo a atenção dele. Vic estava cons- ternado. Mais uma vez, a Companhia estava na cola deles quando julgavam impossível, depois de deixar até mesmo o carro para trás. Como eles estavam sempre tão próximos? Logo fechou os olhos e forçou-se a tirar estes pensamentos da cabeça, em pura concentração. Seu coração batia louca- mente no peito.
Não consigo acessar... nem uma palhinha... de Yacamim... Abriu os olhos e girou em torno de si mesmo, fitando as paredes agora silenciosas Não há nenhum elemento do tripé da Hélio-Hidra por perto!
Não se preocupe, Vic disse Dan em tom profético Quando você estiver pronto, isso não será preciso.
Clara já havia acordado do transe e aberto a porta para a varanda. Na realidade, ela se abria para uma escada de emergência que descia pelos fundos do prédio até o térreo. Mochila nas costas, ela passou pela abertura sem nem olhar para trás.
Dan... Vic olhou para o amigo, sem conseguir mexer as pernas.
Vá, Yacamim. Não tenho nada a temer, senão a sua segurança.
Amanda ergueu olhos lacrimejantes para Dan, se despediu com o olhar, e arrastou Vic pela aber-

tura. Os dois desceram aos trancos e barrancos pela escada de emergência, Clara já vários lances na frente deles.
Dan encarou sereno a porta sendo esmurrada. Logo seria posta ao chão. Fechou a passagem pela qual os amigos fugiram, contornou a mesinha e postou-se no centro do apartamento, de frente para a porta. Não usava armas como os atacantes, mas tampouco imploraria por misericórdia. Pe- gou uma lata ainda cheia de refrigerante na bancada e a arremessou sem cerimônia contra a lâm- pada no teto, que se espatifou e mergulhou o apartamento na escuridão. Que viesse a Companhia.
Nos fundos do prédio, os três corriam para longe dali. Correram por debaixo de árvores atravessa- ram a rua e estavam alcançando o quarteirão seguinte quando o chão tremeu. O apartamento de Clara explodiu em laranja e amarelo, chamas saindo pelas janelas fechadas. A garota lançou apenas um olhar para seu lar destruído, e continuou correndo, com Amanda e Vic em seu encalço.
Pararam cinco quarteirões depois, exaustos e pingando de suor. Amanda sentou, abriu a sacola e olhou dentro dela.
Não temos mais um centavo sequer. Dan usou todo o nosso dinheiro para pagar você, Clara.
A garota ruiva também se sentou. Apanhou na mochila cinco notas de cem e pôs na mão de Amanda Não se preocupe. Não tenho para onde ir agora, certo? Dan me envolveu nessa. Ele me pagou por um serviço e eu vou cumprir. Quando souberem o suficiente, tomo o meu caminho. Ela tornou a colocar a mochila marrom nos ombros Use esse dinheiro para comprar uma barraca para quatro ali ela apontou para loja de itens esportivos e comida naquele mercado ao lado.
Por que eu?
Bom, eu moro aqui, acho uma má idéia que os locais me vejam comprando itens para acampar após meu apartamento ser explodido. E, pelo que entendi, eles estão atrás dele, certo? Ela indi- cou Vic com a cabeça Logo, você é a única que pode ser vista sem grandes problemas.
Sem ter o que argumentar, Amanda correu para o outro lado da rua. Alguns minutos depois, vinha com a barraca compactada nos braços e a sacola nas costas estufada.
Comprei algumas roupas novas na loja de esportes, estamos precisando. Também comprei fru- tas e comidas facéis de fazer com pouco ou nenhum fogo, além de ovos, água e...
Tudo bem, Amanda, a gente agradece, mas você pode nos contar de sua bela lista de compras quando estivermos longe daqui? Clara jogou os cabelos para trás impaciente e voltou a andar em passos largos. Amanda abriu os braços em sinal de incompreensão para Vic, que deu de ombros e seguiu a estressada companheira de viagem.

***

Vic disse Clara, nitidamente aborrecida. O que diabos estamos fazendo em Copacabana?
O dia já ia pelo meio da tarde, e não havia mais sinal de chuva, embora ainda fosse um dia frio. Os três sabiam que a Companhia não estaria longe, mas Vic sentiu que precisava ir até ali, como se algo o convocasse. Ali se sentia mais próximo de seu objetivo, como se pudesse voar para atingi-lo. As meninas olhavam para ele e o acompanhavam sem entender. Estavam cansadas, carregando peso e andando atrás de um garoto indeciso, que parecia circular totalmente sem rumo por um bair- ro cheio de pessoas comuns nas calçadas, cada qual seguindo seu caminho cotidiano. Vic deve ter enlouquecido depois da explosão, depois de perder Dan, pensou Amanda, cheia de dor no coração.
Nas calçadas apinhadas de gente, a vida seguia seu fluxo cotidiano. Alguns homens entregavam panfletos. Crianças passavam correndo. Muitos velhos caminhavam a curtos passos. Um número incalculável de pessoas andavam agitadamente, como se estivessem sempre atrasadas para o que quer que fosse, não importando o horário do dia ou da noite. Na rua, veículos sem fim passavam, em especial táxis e ônibus. O barulho era ensurdecedor, ainda mais para um menino de interior. No entanto, Vic não parecia tomar consciência do mundo pulsante à sua volta. Caminhava obstinado,
como se seguisse uma bússola interna que estava descalibrada. Saiu da Avenida Nossa Senhora de Copacabana, desceu a Duvivier e entrou na Rua Barata Ribeiro. Caminhou um pouco mais. Clara fuzilou Amanda com os olhos, nitidamente implorando por uma intervenção. Ela ia abrir a boca quando Vic parou, tão subitamente que Clara quase se chocou com ele.
O que foi agora?! disse uma irritadíssima Clara, assustando os passantes mais próximos.
É aqui.
Amanda olhou em volta. Era um edifício simples, como qualquer outro no bairro. Uma placa na

fachada dizia: Edifício Tenente Érico. Vic, esse nome...
Sim, eu sei. Vamos entrar.
Vic parou diante da porta do prédio, com as duas logo atrás dele. O porteiro, ao olhar pessoas es- perando para entrar, prontamente apertou um botão na mesa, que fez com que a porta se abrisse. Vic deu boa tarde ao porteiro, que respondeu sem se importar com a entrada de um desconhecido com cara de índio, uma garota ansiosa e uma ruiva de ar nervoso.
Chegaram até o elevador, até que Vic percebeu que não tinha a menor ideia de que andar deveria ir. Ao perceber a indecisão de Vic, Clara bufou, impaciente.
Será que vocês poderiam me dizer o que estamos fazendo aqui, pelo menos?! Esperem aqui orientou Vic, sem responder.
Mas...
É só um momento, Clara.
Voltou até a entrada, se dirigindo ao porteiro.
Oi, me desculpe... eu vim visitar a minha avó, mas me esqueci do número do apartamento... Que cabeça a minha...― ele sorriu, tentando ganhar a simpatia do porteiro. O homem devolveu o olhar impassível. Vestia um uniforme bege do condomínio. Estava tentando sintonizar um canal em uma micro televisão que estava em cima da mesa.
Sei não sinhô... respondeu o porteiro.
É uma velhinha...
Sei não sinhô...
Droga, tem muitas velhinhas por aqui. Pense, Vic, pense...
Ela anda bem devagar, tem um cheiro de colônia e está sempre vestindo azul ou branco. Não sabia como sabia aquilo, mas sabia.
Ah, sei sim sinhô...
―...
―...
Você pode me dizer o número do apartamento? Sei não sinhô...
Você acabou de dizer que sabe!
Sô novo dotô, tô começando ainda. Já vi a senhora, mas não sei o apê não sinhô...
Arg. Teria que ser pelo instinto. Vic voltou até as duas. Amanda estava ansiosa, mas agora Clara

estava segurando o riso. Vic trocou de papel com ela, olhando-a irritado. Mas logo deixou isso de
lado e se concentrou. Chamou o elevador, entrou com as duas. Pôs as mãos sobre o painel dos an- dares, deixou que a energia fluísse... apertou um dos botões sem sequer olhar para ele. Chacoa- lhando, pararam no terceiro andar.
Saíram do elevador, Vic andando de olhos fechados, sentindo a energia... e a porta do 301 estava carregada dela. E lá estava o símbolo da Hélio-Hidra, a gota d’água e o sol entalhados discretamente na madeira. O garoto fez rapidamente o gesto da HH. O símbolo brilhou em amarelo e azul, e a porta simplesmente se abriu para recebê-los. De frente para a entrada, em uma pequena mesa circular, uma senhora estava sentada, folheando um livro e tomando chá. Nem levantou os olhos à chegada dos intrusos.
Bem-vindo, Yacamim. Meu marido me avisou que você viria. 

quarta-feira, 31 de outubro de 2012

[filosofando] Reflexões ao atingir um quarto de século de idade


Rodeado das costumeiras obrigações de fim de ano de faculdade, somadas ainda ao trabalho, o tempo é curto, naturalmente. No entanto, achei importante fazer uso de um momento para escrever sobre certas coisas que circularam pela minha cabeça ontem, quando fiz 25 anos.

A primeira coisa interessante de observar é como a cabeça de uma pessoa muda. Aos 10 anos eu queria ser astronauta e a vida era recheada de cartinhas e problemas amorosos "complexos" que os adultos, achava eu, não compreendiam. Aos 15 eu queria ser tenista da ATP e "astro" do rock - os problemas amorosos continuaram lá. Aos 20 eu estava em crise, trocando de faculdade pela terceira vez e totalmente incerto sobre o meu futuro, mas muito já tinha mudado: eu já sabia que não seria nem astronauta, nem astro do rock, nem tenista profissional. Minha grande meta era muito mais mundana: encontrar uma profissão que fosse a certa para mim. Meu sonho era poder entrar em uma sala que tivesse uma máquina mágica, na qual eu inseriria meu nome e nascimento e ela me daria um top 5 de profissões em que eu seria melhor. Não como essas avaliações de internet ou os testes de aptidão, que são subjetivos (palavra de quem fez)... mas sim uma resposta definitiva, como se eu estivesse encontrado o meu número 42.

Bem. 25 anos. Um quarto de século. O que mudou? Rapaz, muita coisa. O que antes era um completo mistério hoje está muito mais claro. Sei que meus talentos se baseam todos na minha criatividade, em especial os ligados a expressão de ideias por escrito: textos, concepções de projetos diversos, músicas, poemas, roteiros, livros. Sei que algumas categorias soam repetidas aqui mas falando assim eu até acho que sou giga habilidoso. Mas o fato é que eu me contento com as minhas aptidões e me sinto grato por elas, ao mesmo tempo em que busco melhorar no que sei que tenho potencial - e me esforço no que é necessário e não tenho qualquer talento.

A segunda coisa interessante que mudou é bastante assustadora. Quando eu tinha 15 anos (ou mesmo 20), aquela famosa conversa dos adultos era um blá blá blá wiskas sachê blá blá blá sem fim. A maior parte, se não a quase totalidade, simplesmente era esquecida cinco minutos depois (geralmente na fase seguinte do jogo da ocasião). As coisas começaram a mudar na casa dos 20, mas só tomaram corpo mesmo de uns anos para cá. Tenho dois irmãos menores e faz pouco tempo que eu percebi que estava dando conselhos, dicas e visões bizarramente parecidas com as que eu ouvia. Especialmente as opiniões do meu pai, mais próximo de mim em termos de idade, e que felizmente de uns anos para cá vem tendo um diálogo muito mais aberto e de troca comigo do que o famoso papo reto eu falo - você escuta. Eu não sei expressar o quão pasmo eu fiquei na primeira vez em que eu me peguei falando coisas que eu tinha ouvido um mês ou um ano antes. Mais ainda, a minha surpresa em constatar que não era nem da boca pra fora nem reprodução moralista: eu realmente acreditava no que eu estava dizendo, tinha mudado com a maturidade para incluir aqueles valores na minha vida e os tinha agora como tão preciosos que queria passar para os que amo.

Em outras palavras... o que percebo ao chegar aos 25 é o quanto eu evoluí como pessoa. Poderia falar de muito mais, dos meus progressos profissionais, comunicativos (sempre foi uma enorme dificuldade quando a questão é fora da tela ou do papel) e afins, mas eu queria aqui falar é do quão legal foi perceber que, em grande parte, nós crescemos e absorvemos valores que nos são passados e passam a fazer parte de nós sem que nem percebamos. Enquanto vamos envelhecendo, as prioridades mudam, os focos mudam, as responsabilidades aumentam, e com elas a mentalidade, os desejos, a visão de mundo e os valores se expandem, para abrigar um universo que antes era simples, preto no branco. O mundo real é complexo, uma escala completa de 256 cores em todos os seus tons possíveis, e frequentemente as coisas parecem ser o que não são e não são o que parecem ser. Esse é o mundo que vivemos - mesmo que tudo isto seja um grande Matrix - aprendemos e evoluímos. Se tanto mudou especialmente na transição dos 20 aos 25, imagine o salto que será de um quarto à metade de século de idade... apertem seus cintos!

sábado, 20 de outubro de 2012

[Yacamim Livro 1] Capítulos 12 e 13

Uau. quase 1 mês que não posto nada do livro... bem, aí vão novos capítulos. Divirtam-se!


CAPÍTULO 12

Mal o sol tocava o horizonte, e o conversível estava novamente no asfalto. Felizmente, as perfurações de bala na lataria não foram tantas quanto imaginaram no dia anterior. O choque com os disparos provavelmente multiplicou o dano na imaginação deles, pois havia apenas dois furos discretos, na lateral, que puderam ser disfarçados com um adesivo da Apple que compraram de um ca- melô.
Enquanto Dan e Amanda iam concentrados nos bancos da frente, ela guiando e ele com um mapa nas mãos dando instruções, Vic tentava ativar sua suposta "nova parte". Pegara uma pedra no acostamento, logo antes de deixarem a pensão, e agora tentava fazer qualquer coisa de útil com ela. Mo- ver, expandir, derreter, magnetizar... mas não estava dando resultado. Imaginava que pensar o que queria com grande obstinação fosse o suficiente, mas o máximo que conseguiu foi mal-humor e uma bela dor de cabeça.
Preferiram um caminho longo mas sem grandes riscos. Passaram em frente à Cidade Universitária, Estácio, Cosme Velho, até chegar na Lagoa Rodrigo de Freitas. Dali tomaram o Jardim Botânico e seguiram até o Parque Nacional da Tijuca.
Porque viemos para um Parque? perguntou Vic Pensei que tivéssemos lugares importantes para ver, ou algo assim...
Nunca subestime a natureza, Victor. repreendeu Dan em tom paternal Passei anos a fio refletindo, orando e pesquisando locais importantes para o seu treinamento. Portanto, eu o convido a acreditar no meu julgamento.
Dan não foi duro com estas palavras, mas o tom foi irredutível.
Desculpe, eu não quis questionar suas escolhas...
Tudo bem, Vic. Eu entendo sua tendência a questionar tudo. Crescemos juntos, certo? O sorriso de cumplicidade que Dan abriu terminou com qualquer clima de animosidade que a ligeira discussão tenha gerado entre os dois. Eu explico enquanto caminhamos, sim?
Deixaram o carro no estacionamento vazio e foram os primeiros a entrar no parque, pois os portões haviam acabado de ser abertos. Percorreram certa parte do trajeto em silêncio, até que Dan retomasse a palavra.
Acredito que o primeiro lugar que Yacamim deva visitar, uma vez que esteja em contato com a energia e os Supremos, seja um que esteja ligado simultaneamente às três bases do tripé da Hélio- Hidra.
E essas seriam...? perguntou Vic, sem nenhuma pista.
O sol, a água e o contato com a natureza. completou Amanda Como você pôde notar anteontem, nossa morada é cercada de verde, não apenas aquela como qualquer outra em que você entrar. A distância relativa dos centros urbanos anuvia a influência humana no meio e nos aproxima do divino.
Como elemento adicional continuou Dan ―, o local para o qual vamos foi nomeado com o Tupi, língua diretamente ligada aos Supremos e a você, Yacamim. Estamos indo para o Jardim dos Manacás.
Amanda parou de andar, dando um grito de alegria sucedido por dezenas de bater de asas de aves assustadas com o súbito barulho.
Dan, isso é genial! Não há lugar melhor para juntar Yacamim e os Supremos!
Obrigado, Amanda. O rapaz sorriu orgulhoso Acho que é ideal.
É... com licença? Vic olhava de um para outro, a boca ligeiramente aberta Será que vocês
podem me explicar o que está acontecendo? Assim, quem sabe, eu possa elogiar a brilhante idéia também...
Dan e Amanda riram, mas Victor estava começando a ficar irritado de ser levado na brincadeira o tempo todo, quando de fato se sentia excluído de uma festa na qual era o convidado principal.
Vic, Manacá em tupi-guarani significa flor em cores branco e azul. Entende?
Hm... Não, não entendo Dan. Estamos cercado de mata, esse é um elemento do tripé. O azul certamente remete à água, mas o branco...
Remete ao sol, Vic Amanda interpelou Embora o amarelo seja a cor que imediatamente ligamos com o astro rei, a luz que ele nos dá é a que garante vida. Também é a mais forte que conhecemos. A luz do sol, Vic, é branca, pois é o ácumulo de todas as cores. É por isso que somos capazes, por exemplo, de ver o arco-íris. Nada mais é que a decomposição da luz branca.
Vic parou por um momento, chateado consigo mesmo por não ter feito a ligação de imediato. Bom... começou ele genial, Dan.


***

Alguns minutos depois, os três chegaram ao Jardim dos Macanás. Região agradável do parque, se destacava das demais em seus tons. Pétalas pelo chão e nas árvores indo do branco ao lilás não deixavam dúvidas de que estavam no lugar certo. O azul e o branco eram facilmente notáveis em meio ao turbilhão de flores. No centro do Jardim, uma bela fonte reinava. Toda em ferro fundido, quatro figuras femininas, sob um pedestal, sustentavam uma cúpula.
Dan, já li sobre essa fonte! A voz da garota estava mais uma vez em tom eufórico Estas são quatro cariátides, e representam virtudes eternas! A bondade, a caridade, a sobriedade e a simplicidade! São as quatro...
Virtudes dos Supremos Terrenos. concluiu Dan É, Victor, parece que o divino está decidi- damente fluindo aqui... Vic?
Victor estava agachado, apoiado no chão com os olhos fechados. Conseguiu captar tudo que os dois disseram, mas saberia que era o lugar certo para estar mesmo sem ter ouvido uma palavra. A energia que fluia dali era tão gritante que estava surpreso que ninguém pudesse senti-la.
Eu estou bem. Energia... muito forte. foi tudo que conseguiu pronunciar.
Venha, vamos por ali... começou Dan.
Não. A fonte... é do lado dela que devo ficar.
Com isso, Vic se levantou com alguma dificuldade e caminhou lentamente em direção às cariáti
des. Não sentia dor ou medo, mas assimilava com calma toda aquela força. Em parte porque temia explodir caso se mexesse mais rápido. Porém, o real motivo era que estava apreciando, quase que degustando o ambiente. Era uma experiência, e ele estava começando a gostar e se sentir parte da- quilo. Seu lado recentemente acordado, formigando como na reunião da Hélio-Hidra, estava dando sinais de vida e Vic já sentia que era tudo que ele sempre precisou ser. Nasceu para aquilo.
Se agachou ao lado do pedestal. Ele não precisava fazer gestos da Hélio-Hidra ou nada parecido. Não sabia como, mas estava deixando a energia o conduzir e agia por instinto. Tocou a testa levemente com a mão direita e, em seguida, encostou a palma inteiramente no frio ferro da fonte.
Perante vós, cala-se o mais Supremo dos Supremos. Yacamim está aqui e quer falar-lhes. Mostrem-se, norteiem meu caminho rumo ao reequilíbrio da energia.
A voz de Vic saiu alta, clara e cristalina. Era a voz dele, mas ao mesmo tempo não era. Uma combinação, algo novo que desabrochava como as flores azuis e brancas ao redor dele. Amanda e Dan estavam paralisados, em pé na mesma posição desde que Victor se pronunciou pela primeira vez no Jardim. Não fosse a blusa azul marinho de Dan, a amarela de Amanda e as calças jeans de ambos, poderiam se passar por estátuas do Parque sem qualquer dificuldade.
Por um momento, nada aconteceu. Então, quando Vic achava que tinha se enganado, uma voz lhe falou, vinda da cariátide da simplicidade.
Olá, Yacamim. Bem-vindo à sua missão. Fico feliz em ver que sua energia vital acorda e se manifesta, assim como seu claro desejo de assumir sua identidade e sua tarefa. Como lhe falei na primeira vez em que o vi, há alguém que deseja vê-lo... A estátua da simplicidade se calou, e a da caridade mexeu seus lábios de ferro.
Yacamim. Como é bom vê-lo A voz era de tom masculino e vibrante. Era bastante estranho ver uma meiga feição feminina falando com uma voz grave e forte, em completa oposição às suaves formas da escultura A última vez que o vi, era apenas uma criança de quatro anos, brincando no jardim, tentando subir na jabuticabeira. Ali você desconhecia sua força e sua identidade, seu real nome e sua difícil missão, e fico contente que tenha sido assim. Teve a oportunidade de ter uma infância, crescer de forma anônima e tranquila, por mais que sacrifícios tivessem que ser feitos para tal. Era o mínimo que a Hélio-Hidra podia fazer por seu salvador A estátua esboçou uma espécie de sorriso, que completou a estranha cena com louvor Apoena não me apresentou. Sou Turuna, siginfica forte, corajoso, em tupi. Também sou associado à caridade. Juntamente com Cauê e Eté, somos os Supremos Terrenos, mais próximos da existência corpórea e ligação entre os que vivem na carne e os Supremos Superiores.
Yacamim Saudaram em conjunto as estátuas da bondade e da sobriedade.
Supremos Terrenos, preciso dominar melhor minha energia vital para cumprir meu objetivo. Sem isso, não há meio de contornar o imenso desequilíbrio entre luz e trevas.
É verdade, Yacamim Era a voz masculina de Cauê, vinda da estátua da bondade, que lhe falava Você precisará, no entanto, descobrir o caminho por si mesmo, como tenho certeza de que sabe. Apenas podemos lhe dizer que permaneça sempre próximo aos elementos da base da Hélio- Hidra. Assim, estará próximo de nós e o mais escudado possível das trevas até que esteja pronto para enfrentá-las.
Tenha cuidado era Apoena que ressurgia de sua estátua ―, pela saudação que vocês receberam na viagem até aqui, é seguro assumir que a Companhia deixou de lado a gentileza. Evitem seus domínios a todo custo.
Vá em paz, Yacamim. falaram em conjunto as quatro cariátides, suas vozes se juntando em uma benção protetora, tomando corpo em uma lufada de vento que fez girar no solo as pétalas azuis e brancas.
As estátuas mais uma vez estavam imóveis, o local parecia um parque comum novamente, embora a energia seguisse vibrante e evidente. Ao menos para o jovem que agora se levantava, retirando a mão do pedestal e olhando com admiração para as figuras femininas. Olhou para os seus acompanhantes. Amanda estava com expressão mista de admiração e surpresa. Passava inúmeras vezes
as mãos nos cabelos e o gesto com os braços da Hélio-Hidra. Dan estava chorando copiosamente, olhando para uma das cariátides sem sequer piscar.
Yacamim pegou uma flor branca e uma azul do chão, juntou as duas em um arranjo improvisado e as colocou nos cabelos de Amanda, que agradeceu com o olhar. Depois alisou o ombro de Dan, encorajando-o. Ajeitou a barra de seu próprio jeans, olhou uma vez mais para a fonte e se virou em di- reção a entrada do Parque.
Vamos.


CAPÍTULO 13

Voltaram a entrar no conversível e saíram do Parque. Vic descobriu, desapontado, o quão longe ainda estava de poder verdadeiramente servir aos Supremos. À medida que iam se distanciando do Jardim dos Manacás, aquela avassaladora energia que guiava seus instintos e o modificava por inteiro foi se esvaindo. Yacamim ainda parecia longe de seu auge, e certamente o treinamento se fazia necessário com urgência. Como já havia ficado claro há tempos, ele precisaria trilhar o caminho sem grandes auxílios, o que significava que este aprimoramento era uma espécie de treinamento interno, um auto-conhecimento para fazer aflorar Yacamim em sua plenitude.
Vic comentou da mudança de estado com os amigos. Não que fosse necessário, a diferença de comportamento entre Victor e Yacamim presenças bastante distintas em uma mesma pessoa eram claras e cristalinas, como o garoto em preparação e o adulto austero.
Acho melhor nos resguardarmos por enquanto. constatou Dan Já trilhamos um longo caminho hoje, não sabemos quantos passos estamos à frente da Companhia. Há companheiros por aqui. Amanda, siga para Santa Teresa. Sei de um ótimo lugar para descansarmos até amanhã.
Minutos depois, encostavam o conversível azul metálico na porta de uma modesta casa em uma das muitas ruas inclinadas de paralelepípedos de Santa Teresa. À porta, um tapete de "Bem-vindo!" e o já conhecido brasão da Hélio-Hidra, discretamente talhado na madeira. Amanda tomou à frente e, encoberta pelo corpo dos dois rapazes, fez o gesto da HH. Dan tocou a campainha logo em seguida.
Uma bondosa senhora entreabriu a porta segundos depois. Muito rapidamente, assimilou a marca na porta brilhando intensamente e as três pessoas paradas diante dela.
Benditos sejam os Supremos! Entrem, entrem! disse ela rapidamente, abrindo caminho para os recém-chegados e fechando rapidamente a porta em seguida.
Uma salinha agradável os recebeu. O clima era aconchegante, um ventilador de teto trabalhando em velocidade, poltronas estampadas em padrões monocromáticos e quadros de paisagens naturais nas paredes. A senhora veio ao encontro deles, e se curvou em respeitosa reverência.
Yacamim ela saudou Sou Polônia, hélio-hidrana e maravilhada em recebê-lo em minha modesta casa.
Agradeço a generosidade, dona Polônia. Lembro-me da senhora na reunião, dias atrás. Fico feliz que tenha retornado bem e em segurança. Sua filha está bem?
Sim, sim, ela está nos fundos preparando o almoço. Então se virou para Amanda e Dan Fico muito feliz em ver vocês também.
Obrigada, Polônia. Eu irei até a cozinha ajudar a Tiffany, sim?
Claro, minha querida. Basta seguir em frente e virar à direita A bondosa anfitriã olhou para os dois rapazes Por favor, se acomodem. A casa é de vocês.
Eles se sentaram lado a lado em duas poltronas abaixo de um majestoso quadro do mar em ressaca. A mulher sentou-se no assento vazio, no outro canto da salinha.
Como têm passado? Imagino que já estejam seguindo os passos do manuscrito, estando tão longe de casa...
De fato, estamos respondeu Dan, cauteloso Receio que não possa dizer muito mais do que isso, tenho certeza de que compreende...
Claro, claro.
É mais para a sua segurança e a de Tiffany do que a nossa própria. Quanto menos detalhes souberem, menor o risco que vocês correm.
A senhora olhou para o quadro do mar por um tempo, pensativa.
Eu pintei este quadro anos atrás, pouco depois de me tornar hélio-hidrana. Nas religiões tradicionais, mães, tias e avós carregam as crianças para a religião, passando o aprendizado e a fé que têm. Curioso que tenha sido Tiffany a receber o sinal primeiro. De fato, ela é hélio-hidrana desde pequena, embora eu só tenha descoberto quando fui também chamada, tempos depois.
Ainda perdida em pensamentos, a idosa mulher continuou a admirar seu trabalho na parede, e os rapazes acharam melhor não perturba-la. Pouco depois, Amanda veio da cozinha chamando-os para o almoço.
Quando chegaram no aposento, Tiffany estava dispondo os talheres na mesa. Devia ter por volta de vinte e cinco anos, cabelos pretos e lisos presos em um coque. Era alta e magra, já tendo certamente passado há muito tempo em altura a mãe.
Yacamim saudou ela Bem-vindo. Espero que aprecie a refeição.
Olá Tiffany, obrigado. Tenho certeza de que será o caso.
Foi um almoço muito agradável. O ambiente se encheu com as vozes e risadas. Para Vic, era um

prazer incalculável desfrutar de um almoço caseiro e conversar banalidades como se não houvesse uma batalha para ser vencida lá fora. Peixe saboroso com molho de alcaparras, batatas e refresco de laranja formavam o cardápio, e tudo estava delicioso.
Mais tarde, além de lhes mostrar o banheiro e ceder toalhas para que tomassem banho, a filha de Polônia indicou para os rapazes o quarto de hóspedes ao lado da escada. Amanda ficaria no segundo andar, no mesmo quarto de Tiffany.
Victor se sentou na cama e abraçou os joelhos, assim que Dan fechou a porta do aposento.
E então... perguntou o jovem de olhos verdes como se sente, Vic?
Fraco falou com sinceridade. Fica uma sensação de impotência sentir todo o corpo vibrar
com a energia avassaladora de hoje mais cedo e perdê-la com a mesma velocidade que veio. Eu preciso aprender a encontra-la dentro de mim, Dan. Aprender a fazê-la aflorar na hora certa e só a guardar quando necessário. Talvez jamais prendê-la novamente.
Isso seria impossível, Victor. Embora sua energia seja formidável, ela não é infinita. É preciso descansar, assim como resguarda-la para quando for necessária. Por outro lado, você certamente irá crescer em poder mais e mais, até o ponto em que sua energia será virtualmente inesgotável. Mas isso levará tempo, e irá requerer um treinamento adequado. Os Supremos jamais nos falaram dos limites de Yacamim, se é que eles existem. Como sempre...
Eu sei, terei que descobrir sozinho. foi uma resposta automática, porque esta era a realidade e já estava se acostumando com ela.
O dia seguinte amanheceu chuvoso. Não tinham um planejamento definido, por isso passaram o início da manhã conversando no quarto de hóspedes com Amanda. O assunto era a Hélio-Hidra.
Sei que Apoena é aquela que enxerga longe, e que ela tem como virtude a simplicidade, a julgar pela estátua que incorporou relembrou Vic Turuna me contou que é sinônimo de força e coragem, além de ser extremamente caridoso. E os outros dois?
Cauê, significa homem bondoso que age com inteligência. É um Supremo extremamente perspicaz e doce como mel. informou Amanda, prontamente.
E Eté, honrado, verdadeiro e genuíno. É também o Supremo da sobriedade. Ele é muito prudente e cristalino, informa sempre a verdade e é senhor dos alertas. Também é o Supremo Terreno mais próximo dos Superiores. disse Dan Os quatro juntos são o contato divino mais próximo que temos, os que mais atuam na vida carnal. Quando temos um Superior nas reuniões, pode contar que seja um Terreno. De fato, somente os quatro entraram em contato com os Supremos Superiores, o que os fez sem dúvida especiais a ponto de se tornarem os Supremos Terrenos.
Mas então... quem os apoiava antes deles se tornarem Supremos Terrenos? perguntou Vic Pelo que captei, todos estes estavam vivos em carne quando eu nasci. E quem eles eram em vida, afinal?
Como sempre, não podemos lhe responder isso. Mas antes deles, haviam outros quatro. É o ciclo terreno que se segue. Quando chega a hora, quatro hélio-hidranos recebem os quatro Supremos Superiores. Os Terrenos seguem então adiante, se tornam espíritos de Luz, que apóiam o trabalho dos próximos Terrenos que assumirem, juntamente com os que já o fazem. explicou Amanda Mas não pense que são muitos... somente almas realmente boas e preparadas se tornam Terrenos. Pode levar décadas ou até centenas de anos para acontecer.
Algum tempo depois, os visitantes se preparavam para sair. Estavam levando alguns pães, biscoitos e garrafas de água, por insistência de Polônia, embora os três assegurassem que poderiam comprar os suprimentos necessários no caminho. Optaram também por deixar o conversível estacionado ali, pois o carro já era conhecido da Companhia e seria um facilitador para que fossem encontrados.
Para onde vamos agora, Dan? Você é o guia, afinal.
Os rapazes trocaram sorrisos, brincando com o que havia sido uma discussão anteriormente 
Melhor pegarmos um táxi. Tem uma pessoa que você precisa conhecer.